Leanan sidhe a fada vampira

Após um curto periodo fora do ar, estou postando um texto que me chamou muito a atenção. Este texto foi escrito por Rick Nobre especialmente para a revista Wicca (escrita pela Eddie Van Feu) da editora Modus.


Este belo ser sinistro é envolto em mistérios, confusões sincretismos e sombras. Características diversas se entrecruzam a ponto de alguns considerarem que ligeiras diferenças de nomes referem-se a criaturas totalmente diferentes dependendo da região. A concepção mais comum de Leanan sidhe hoje é a de uma fada com poderes de musa, capaz de inspirar artistas a terem enorme sucesso, porém condenando-lhes a uma vida curta. A forma mais luminosa e menos cruel deste ser (cuja origem mais provavel é celta) é a sua versão irlandesa, cujo nome é exatamente Leanan Sidhe. Ela seria inspiradora de poetas, cantores e todos os artistas. Um "espirito de vida", assim como sua irmã Bean Sidhe, (uma das versões da popular Banshee) seria o arauto da morte. O encontro do poeta com a sua musa confunde-se com o aisling, um estilo literário muito popular na Irlanda dos séculos XVII e XVIII. Nele o poeta ao andar por uma colina tinha a visão do próprio espirito da Irlanda na forma de uma mulher, ora bela e luminosa, ora feia e acabada. O aisling tornou-se um estilo de forte cunho politico, pois comumente a jovem em sua visão lamentara o estado da nação irlandesa e prenunciava a volta de seus tempos gloriosos.
Outra forma desta fada aparece na ilha de man, pequeno estado independete do Reino Unido que quase ninguem conhece, mas que é o berço de uma das interpretações mais comuns deste ser. chamada de Leanhaum Shee, ela tambem é inspiradora de artistas. Permanecendo invisivel para todos os outros, ela aparece para quem ela escolhe com uma beleza inconcebivel tão deslubrante que é quase impossivel resistir a ela. Ela concede inspiração para o artista executar grandes obras, alimentando-se da emoção emanada dele. Aqui começam as divergências. Alguns consideram que seja um trato simples entre as partes: inspiração em troca da emoção profunda da qual ela se alimenta. Outros sustentam que ela se alimenta de fato da força vital do artista, levando-o a morte a certa em um certo prazo de tempo. Neste caso a caracteristica vampirica está presente, não pela drenagem de sangue mas da própria energia de vida após a morte do homem a fada o carregaria para seu reino.

As etimologias do nome já abrem as portas para outras caracteristicas conhecidas das fadas. Tanto as formas Leanhaum Shee quanto a Leanan Sidhe significam "fada-amante" ou "fada-namorada". Alguns tradutores apontam a palavra de origem galesa leanan como sendo "amor de minha alma e espírirto" ou "minha inspiração" dentre outras possiveis que incluem a"concubina" e "favorita". Sidhe é a palavra para "fada" e refere-se geralmente a seres encantados denominando também um povo antigo que teria ocupado as "Terras Verdes" muitos e muitos anos antes do aparecimento do povo irlandês. A fada teria então o habito de tomar o artista como amante. A morte prematura do artista poderia ser, segundo outras interpretações, uma profunda e desesperadora tristeza nascida do amor pela musa e principalmente da falta que ela faria quando fosse abandonado por ela, abrindo uma possibilidade bem diferente e interessante já que a fada não drenaria até a morte e mostrando que é é possivel que ela perca o interesse por ele. É muito curiosa a interpretação que aparece dando conta da responsabilidade do artista na perda de sua musa, numa simbologia fascinante sobre a morte (real ou figurada) de todos que fazem arte ao não honrarem seu compromisso com este que seria um "dom" divino. Também dá suporte a à teroria de que ela não seria um espirito maléfico já que a morte vem dos proprios medos e obsessões do artista e não de ações diretas da Leanan Sidhe.

Esta visão da Leanan Sidhe, onde ela domina um homem e o consome até a morte, deriva, provavelmente, de um cruzamento com o mito da Sucubus. A teoria mais provavel aponta que foi a Igrja Católica, em sua cruxada para converter toda a Europa, que amalgamou o mito da Leanan com o da Sucubus (muito popular na época) com o objetivo de demonizá-la e enfraquecer a relação dos povos de origem celta com sua divindades. Isso, na verdade aconteceu com boa parte das fadas da cultura celta transformadas em algo muito parecido com as sucubus pela Igreja. Com o tempo caracteristicas vampiricas foram se tornando mais e mais presentes. Acredita-se que ela não bebe o sangue das vitimas, mas o armazena em seu caldeirão, que seria fonte de sua beleza que ela não bebe o sangue das vitimas, mas o armazena em seu caldeirão que seria a fonte de sua beleza e seu poder de inspirar. Outras vertentes dizem que ela suga o sangue das pessoas comuns para se alimentar, mas de seus artistas escolhidos suga sua força vital, levando-os à morte. Ainda dentro desta vertente mais sinistra, existe uma versão que afirma que apesar de dotada de uma beleza incomensurável, é possivel, sim, resistir à sua sedução. Se isso acontecer ela se torna escrava daquele que deveria ter sido sua vitima. Mas se o artista cair em seus encantos, diz-se que a única forma de escapar com vida é encontrar outro para colocar em seu lugar. De fato Seria a única escapatória já que a morte não lhe traria alívio, pois ele seria carregado por Leanan para seu mundo.


Por outro lado, diz-se também que a Leanan desenvolve muitas vezes um instinto de proteção em relação ao artista que inspira. Essa relação pode até mesmo chegar ao ponto que a fada se apaixonaria pelo seu protegido. Sua beleza seria a real fonte de seu poder inspirador levando seus amantes-artistas a produzirem obras invariavelmente sobre amor, desejo e desespero.
Existem também vários relatos desta fada tomando a forma humana e sendo capaz de inspirar homens para guerra. Uma história tradicional ligada a Leanan Sidhe dá conta de sua influência com o Rei Eugene de Munster. Tomando a forma humana e assumindo a identidade de uma poetiza chamada Eodain, ela teria inspirado o Rei de tal forma que ele foi capaz de derrotar completamente seus inimigos. Após isso ele teria se entregado à luxúria e aos prazeres mundanos. Abandonou seu reino, mudou-se para a Espanha, onde constituiu a família. Voltando ao seu reino depois de nove anos, encontrou seu povo passando fome, enquanto alguns poucos banqueteavam em seu castelo. Mesmo tentando livrar o povo desta condição, estes não mais confiavam no rei que os abandonara. Procurando novamente Eodain, o rei pediu por auxilio e ela foi capaz de inspira-lo com seu poder de poetiza e de profeta, levando Eugene a vitória e restabelecendo a ordem em seu reino.



O tempo e as diferenças vão modificando até mesmo as interpretações mais suaves deste mito. A mesma cultura irlandesa que a via como um espirito inspirador virtualmente inofensivo, hoje a vê como um ser vampírico, chegando até mesmo a identificar seu nome como se referindo também a outra criatura, Dearg-due, cujo nome se traduziria como "sugadora de sangue vermelho". Chega-se até a considera-la uma morta-viva, desconsiderando totalmente sua tradição como fada, um ser descendente dos Sidhe, de outros mundos encantados.
Ela tambpem confunde-se com Aine ao lhe ser atribuido o titulo de "namorada dos Sidhe". Aine seria a filha do deus Manannam Mac Lirou, segundo outras vertentes, sua esposa.
Neste caso, ela seria a filha de Morrigu que possuia a Cathair Aine, uma pedra capaz de causar loucura. Essa relação curiosa, pois remete a obssessão dos amantes de Leanan Sidhe, uma vez que, segundo algumas versões a única alternativa à morte nas mãos da fada seria justamente a loucura. Feixes de palha são queimadas em sua homenagem na noite de São João na Irlanda.


Com tantas variações e sincretismos, a visão mais comum da Leanan Sidhe hoje em dia é um amálgama de praticamente todas essas caracteristicas: ela é uma fada, uma vampira e uma musca, capaz de iluminar os artistas com sua beleza e inspiração esplendorosas, sendo ainda assim, um ser envolto em escuridão. Em ultima instância, Leanan Sidhe parece ser seu processo criativo. Os poetas galeses da idade média, famosos por suas vidas curtas e intensas, não diferem nada de mitos modernos como James Dean e Kurt Cobain. O estereótipo do artista sofrido, infeliz, agoniado e brilhante ainda faz parte do imaginário mundial, alimentado por esses grandes ídolos, exceções que, por sua enorme projeção, importância e relevância viram regra. E uma musa que inspira obras-primas em troca da vida, corpo e alma do artista é mais uma bela, assombrosa, terrivel e trágica história de amor.

Um comentário:

  1. Amei a história...eu em umas semana atrás eu li um livro chmado O Inverno das Fadas...
    Mayara

    ResponderExcluir